Sobrevivendo a um relacionamento abusivo
Date
2018Author
SOUZA, Diogo do Nascimento
SILVEIRA, Thassya Álvares Bezerra Machado
Metadata
Show full item recordAbstract
A violência é um dos traços mais sombrios da espécie humana que,
mesmo sustentando o título de racional, carrega um longo histórico violento em
todos os níveis de convivência. Um dos tipos mais silenciosos, e não menos grave,
acontece no âmbito dos relacionamentos amorosos, os chamados relacionamentos
abusivos. O assunto é polêmico e gera reações controversas nas pessoas que ora
defendem as vítimas de parceiros abusivos, ora as culpam por tal situação.
Nos últimos anos, o assunto vem ganhando cada vez mais destaque na
mídia e muito tem se falado a esse respeito. Uma em cada cinco mulheres considera
já ter sofrido algum tipo de violência de parte de algum homem, segundo dados da
Pesquisa Mulheres Brasileiras nos Espaços Público e Privado (Fundação Perseu
Abramo/SESC, 2010). A pesquisa ainda aponta que o parceiro, marido ou
namorado, é o responsável por mais 80% dos casos reportados. A principal razão
para a violência apontada por 46% das mulheres e 50% dos homens é o ciúme.
Dentre outras causas, 23% das mulheres consideram o alcoolismo e outros
desequilíbrios psicológicos. Já 19% delas citam a não aceitação e o desrespeito, por
parte dos homens, na busca por autonomia.
No entanto, por estar inserido no contexto doméstico, muitos são os
casos que não chegam nem mesmo ao conhecimento da família da vítima. E a
informação é uma das principais armas para o combate deste tipo de violência, pois
ajuda a entender e identificar traços comportamentais tanto de quem a sofre quanto
de quem a pratica, encoraja as vítimas a buscarem ajuda e quebra preconceitos.
Segundo o dicionário Aurélio (1999), violência é o “estado daquilo que é
violento, abuso de força”. Sinônimo de opressão, tirania e coação. A violência
doméstica é definida como crime pela Lei “Maria da Penha”, nº 11.340, de 7 de
agosto de 2006 que a classifica em cinco tipos: física, psicológica, sexual,
patrimonial e moral. A Lei ainda define, no Artigo 8º, Inciso III, “respeito, nos meios
de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma
a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica
e familiar” (BRASIL, 2006).
Os meios de comunicação têm papel fundamental no processo de
conscientização da população. No entanto, esse tipo de pauta não ocupa muito
espaço no jornalismo diário da grande mídia, ocupada em narrar os acontecimentos
5
cotidianos, exceto pelos casos extremos, como os de feminicídio. Segundo Kovach e
Rosenstiel (2004), uma das funções do jornalismo, além de comunicar a verdade e
dar voz àqueles sem voz, é fornecer informações para que os cidadãos possam ser
livres e se autogovernarem.
Pela complexidade e gravidade do assunto, uma das alternativas para a
cobertura é o jornalismo especializado, aquele voltado a uma temática ou público
específicos. E, com o objetivo de colaborar com a discussão que circunda os
relacionamentos abusivos e também as suas consequências, o livro-reportagem
“Sobrevivendo a um Relacionamento Abusivo” reuniu relatos de pessoas que
vivenciaram situações pertinentes à temática abordada. Cada relato foi construído
em forma de narrativa para contar a história de suas vidas antes, durante e depois
desse relacionamento, preservando as identidades das pessoas citadas, bem como
datas e locais. O principal objetivo foi o de mostrar histórias de superação
inspiradoras para outras pessoas vítimas desse tipo de relação e também para
quem nunca viveu algo parecido, mas deseja saber mais e conhecer exemplos reais.
A reunião dos relatos coletados a partir de entrevistas resultou num livro reportagem do tipo perfil que, segundo Lima (2009), destaca o lado humano de uma
personagem pública ou anônima. Portanto, a temática do livro-reportagem são os
relacionamentos abusivos, contando a trajetória de três pessoas que sobreviveram a
este tipo de relacionamento. Para compor o livro, foram entrevistadas cinco pessoas
que contaram suas histórias: quatro mulheres e um homem. Duas das mulheres
passaram por desdobramentos dos seus antigos relacionamentos durante a
realização deste trabalho e, por esse motivo, seus relatos foram suprimidos do
produto final para manter-se alinhado à proposta inicial de contar histórias de quem
deixou tal relacionamento para trás.
O livro-reportagem é um produto jornalístico, caracterizado por Pessa
(2009) como impresso e não periódico que apresenta reportagens em grau de
amplitude superior ao tratamento nos meios de comunicação periódicos. Como
sendo narrativo e com maior profundidade no tratamento no tema, permite um
trabalho mais elaborado, sem a urgência da notícia factual, explorando técnicas e
estilos textuais que permitam a impressão de detalhes no texto que ajudam a obter
uma nova visão sobre o assunto.
Os relacionamentos abusivos precisam ser debatidos, mas não de forma
sensacionalista ao expor as desgraças causadas por eles, e sim falando sobre o
6
tema, seu impacto na vida de quem passa por isso e as consequências. Este livro reportagem tem como objetivos específicos oferecer informação e exemplos para a
sociedade, estimular o diálogo a esse respeito, ouvir o que as pessoas que saíram
de relações abusivas têm a dizer e informar possíveis soluções.
Todas as cinco fontes foram entrevistadas em Aracaju/SE, entre os
meses de junho e setembro, e seus relatos serviram de matéria-prima para a
redação do texto narrativo sobre suas experiências. Dos três relatos selecionados,
foram definidos os pontos de partida e fechamento de cada relato, de acordo com a
permissão de cada uma das fontes, para que o texto contenha um início,
desenvolvimento e desfecho.
A narração do “depois” foi a responsável por trazer o processo de
superação após o fim do relacionamento abusivo, algo correspondente ao “final feliz”
das estórias dos livros. Afinal, essas histórias destes verdadeiros sobreviventes
podem servir de exemplo de força e de coragem para enfrentamento da violência, do
preconceito, do comodismo, da apatia e do machismo que circunda a discussão
sobre o tema.
Essas vozes foram ouvidas e projetadas e o livro resultante deste projeto
é mais um meio para se falar nesse assunto. Um pequeno passo nessa luta, é
verdade, mas ainda assim, uma forma de colaborar com o fim dos relacionamentos
abusivos